sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

QUASE HISTÓRIAS:E O AMOR SAIU PELA JANELA (8)

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BAILE DA ILHA FISCAL (QUADRO: FRANSCISCO FIGUEIREDO)
Gertrudes não tinha apenas pulgas atrás das orelhas. Mantinha, como sempre fazia em ocasiões como a que se avizinhava, os dois pés atrás. Entende-se. O marido João, em termos de gafe, é dono de longa folha corrida. Rara a festa em que ele, tocado pela uca, não apronta das suas. Não foi sempre assim, é certo. É coisa de uns vinte e poucos anos para cá – desde o tempo em que passou a ignorar a valiosa (embora inútil) advertência do ministério da Saúde e nunca mais bebeu com moderação.

Enquanto aguardava Gertrudes se arrumar, já vestido para a festança, João entornou o possível. Fiel às tradições, queria chegar “no ponto”. Só assim consegue ser o que julga ser: um sujeito engraçado, que faz todo mundo rir, a quem parentes e amigos têm na coluna das presenças obrigatórias. Um sedutor, enfim. De ilusão, dizem, também se vive, ainda mais quando o destilado dá uma rasteira na capacidade de discernir.

Quando Gertrudes entrou na sala, o roteiro já tinha o final traçado.

-- Pelo amor de Deus! Veja se hoje se você comporta. Nós vamos na formatura do Jaiminho, nada de piadas, sem gracinhas. É o primeiro médico da família. Lá, só vai dar gente de bem: pai de doutor, mãe de doutor, avó de doutor. Compreendeu, João? É baile para gente fina. Estou cansada de passar vergonha por sua causa. Antes, punha panos quentes; agora, não mesmo. Quer ficar enchendo a cara? Fique.

-- E eu sou de dar fora em festas?

-- Cínico. Ás vezes, acho que você não bate bem da cabeça.

-- Todo mundo ri das minhas brincadeiras, Gertrudes. Só você implica com elas. Você vê maldade em tudo.

-- Está bom. Já lhe disse o que tinha para dizer. Não me faça passar vergonha. Hoje, não. Pelo amor de Deus.

João foi a banheiro, retocou os fios de cabelo que lhe restavam, ajeitou a camisa dentro das calças, fez gargarejo para amenizar o bafo. Respirou fundo.

De volta à sala, João tinha na cabeça resposta para a pergunta inevitável de Gertrudes, arma que nunca tivera coragem de usar:

-- Então, João, como estou? Não vai falar nada?

-- Você está bem, Gertrudes.

-- Puxa! Só isso?

-- Você está ótima, meu bem, mais emperiquitada que cachorra de madame. Não passará despercebida. (OS - JAN/2017)

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Alceu respirou fundo, resolveu mentir (amou Matilde, sim) e colocar um ponto final na história arrastada, pois de uns tempos pra cá só tinha cabeça, coração e membros para Verinha, a cunhada mais nova, dona de bunda e peitos fartos... Por Orlando Silveira


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